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(nas disciplinas Língua Portuguesa, Língua Inglesa e Literatura), bem como sua utilização como mais uma ferramenta
para o ensino-aprendizagem de modo a tornar o processo educacional mais instigante e desafiador para
o aluno dessa geração tecnológica.


sexta-feira, 5 de março de 2010

Letramento e tendências de Ensino atuais

Letramento e tendências de ensino atuais: os gêneros textuais como suporte das novas metodologias

Rosália de Oliveira Soares
Universidade Federal do Pará


 RESUMO: Neste artigo, propõe-se a discutir o conceito de letramento e como este fenômeno da lingüística vem sendo compreendido na atualidade. Também analisa-se como essa nova visão, agora do letramento em seu sentido mais amplo, vem contribuindo para a renovação das tendências de ensino voltadas para a questão dos gêneros textuais.

 PALAVRAS-CHAVE: Letramento; Tendências de ensino; Gêneros textuais

Introdução
Conceituar letramento não é fácil, pois essa é a terminologia nova de um fato que pode ser analisado sob as mais variadas formas.
O aperfeiçoamento dos conceitos de “gêneros do discurso” e “formação do professor” vem intensificando as discussões sobre Letramento e ensino de Língua Portuguesa nos últimos anos. Por isso, podemos nos deparar a todo instante com discussões sobre metodologias do ensino de produção textual, que são colocadas em foco em todas as discussões educacionais da atualidade.
Estas discussões não são simples, pois há diferentes modos de abordagens para tratá-las. Em vista disso, a proposta deste trabalho é mostrar a relação entre letramento e alfabetização e como dessa relação se está tirando proveito para minimizar o mito do letramento (veiculado pela idéia de um letramento autônomo) e até mesmo para ampliar o conceito da própria alfabetização. Também propomos uma reflexão sobre como um professor que passou por formação acadêmica atualiza e proporciona a construção do conhecimento nas situações reais em sala de aula amparando-se em concepções interacionistas. Aproveitamos ainda para fazer uma breve abordagem das novas propostas de ensino da língua materna baseadas nos gêneros textuais, visando a competência comunicativa do sujeito, possibilitando-o interagir efetivamente na sociedade.
Tendo isso em vista, organizamos o presente artigo em três partes: Na primeira, apresentamos a relação entre letramento e alfabetização como duas faces da mesma moeda e não como processos distintos e distantes, já que a alfabetização deve ser vista como um dos processos de letramento. Na segunda parte abordaremos algumas discussões sobre as tendências atuais para o ensino de língua portuguesa, enfatizando a produção textual e diferentes meios de alcançá-la satisfatoriamente diante do quadro desestimulante que as últimas pesquisas demonstraram, já que a realidade nas escolas não mudou muito diante da abundância de novas teorias de cunho metodológico sobre o ensino/aprendizagem de língua materna nos últimos tempos, culminando para uma breve discussão a respeito da formação do professor (peça importantíssima nesse processo). A terceira parte, destina-se a abordagem sobre os gêneros discursivos, numa perspectiva interacionista, evidenciando a imagem de um receptor real de textos inseridos também na realidade do produtor desses textos.

1. Relação entre Letramento e Alfabetização
A palavra letramento não é ainda compreendida pelas pessoas porque é uma palavra nova que entrou em circulação nos meios lingüísticos há pouco tempo (não está ainda dicionarizada) bem como suas correlatas em uso (como letrado e iletrado) também são mal compreendidas.
Foi no campo semântico das palavras letrado e iletrado (que conhecemos bem) que surgiu a palavra letramento:
Letrado, segundo o dicionário, é o indivíduo erudito, versado em letras (literatura e línguas). Iletrado é aquele que não tem conhecimentos literários, não é erudito, portanto, analfabeto ou quase analfabeto. Porém, o sentido que temos atribuído aos adjetivos letrado e iletrado não está relacionado com o sentido da palavra letramento como vem sendo utilizada hoje por estudiosos do fenômeno.
Para entendermos esse sentido, se faz necessário conhecer um pouco da história do surgimento desta palavra e os motivos que levaram a criação dela:
“A palavra letramento apareceu pela primeira vez no livro de Mary Kato: No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística, de 1986 e não é definida pela autora e, depois dessa referência, é usada várias vezes no livro; foi, provavelmente, essa a primeira vez que a palavra letramento apareceu na língua portuguesa - 1986.
Depois da referência de Mary Kato, em 1986, a palavra letramento aparece em 1988, no livro que, pode-se dizer, lançou a palavra no mundo da educação, dedica páginas à definição de letramento e busca distinguir letramento de alfabetização: é o livro Adultos não alfabetizados - o avesso do avesso, de Leda Verdiani Tfouni de 1988, um estudo sobre o modo de falar e de pensar de adultos analfabetos.
Mais recentemente, a palavra tornou-se bastante corrente, aparecendo até mesmo em título de livros, por exemplo: Os significados do letramento, coletânea de textos organizada por Ângela Kleiman, (Campinas, Mercado das Letras, 1995) e Alfabetização e letramento (1995), da mesma Leda Verdiani Tfouni, anteriormente mencionada.” (www.moderna.com.br)
Começamos a precisar dessa palavra para nomear uma nova idéia que surgiu e para a qual não dispúnhamos de um vocábulo adequado que a nomeasse, por isso inventamos essa palavra. Cada vez que surge um fenômeno novo, surge uma palavra nova. É assim que acontece sempre.
A palavra letramento pode ser considerada como o resultado da ação de ensinar e aprender as práticas sociais de leitura e escrita. Alcançar a condição de letrado (para um grupo social ou um indivíduo) é atingir o estado ou condição de ter-se apropriado da escrita e de suas práticas sociais.
Nesse contexto, é importante ter em mente que ter-se apropriado da escrita é diferente de ter aprendido a ler e a escrever. Aprender a ler e escrever significa adquirir uma tecnologia, a de codificar em língua escrita e de decodificar a língua escrita; apropriar-se da escrita é utilizá-la com competência comunicativa, sentindo seus efeitos e provocando efeitos nos destinatários de sua expressão através dessa modalidade de linguagem.
Se formos comparar os significados das palavras letrado e iletrado (usadas normalmente pelas pessoas) citadas no início deste trabalho, vamos encontrar uma diferença substancial de sentido. Letrado e iletrado como adjetivos correlatos a letramento podem ser entendidos agora de uma maneira diferente da encontrada nos dicionários: letrado passa a ser o adjetivo que caracteriza a pessoa que, além de saber ler e escrever, faz uso freqüente e competente da leitura e da escrita. Será usado também o adjetivo iletrado como seu antônimo, como uma pessoa que não faz uso competente da leitura e da escrita. Uma pessoa que se aprende a ler e a escrever e envolve-se nas práticas sociais da leitura e da escrita é diferente daquela que não sabe ler nem escrever, ou mesmo que saiba, não faz uso da leitura e da escrita. Uma pessoa pode ser alfabetizada mas não ser letrada se não pratica a leitura e a escrita
Nesta nova perspectiva, começam-se a diferenciar as condições de ser alfabetizado e as de ser letrado (viver na condição ou estado de quem sabe ler e escrever). As diferenças entre analfabeto, alfabetizado e letrado partem do pressuposto de que quem aprende a ler e a escrever e passa a usar a leitura e a escrita, a envolver-se em práticas de leitura e de escrita, torna-se uma pessoa diferente, adquire um outro estado, uma outra condição social e cultural. Isso não quer dizer que a pessoa vai mudar de nível ou de classe social, cultural, por isso não podemos nos deixar levar pelo mito do letramento, que “é constituído por um conjunto de crenças e representações de natureza ideológico-cultural inerentes ao processo de letramento do tipo valorizado na escola e reproduzidas pelas instituições de prestígio na sociedade burocrática, inclusive igrejas e sindicatos” (Signorini, 1994, p.21). A mudança ocorre em seu modo de viver na sociedade, sua inserção na cultura, o que o torna diferente também cognitivamente, ou seja, a pessoa passa a ter uma forma de pensar diferente de quando era analfabeta ou iletrada.
O letrado também passa a falar de forma diferente do iletrado e do analfabeto, porque o convívio com a língua escrita traz como conseqüências, mudanças no uso da língua oral, nas estruturas lingüísticas e no vocabulário.
O que será então o fenômeno do letramento?
Letramento é muito mais que alfabetização na medida em que é um estado ou condição de quem interage com diferentes portadores de leitura e de escrita, com diferentes gêneros e tipos de leitura e de escrita, com as diferentes funções que a leitura e a escrita desempenham na nossa vida. Porém, o letramento não pode ser visto dissociado completamente da alfabetização porque à medida que o analfabetismo vai sendo minimizado, vai se sentindo a necessidade de algo mais. Não basta apenas aprender a ler e a escrever, por isso foi detectado um novo fenômeno, gerado das novas necessidades, ao qual foi dado o nome de letramento.
As pessoas se alfabetizam, aprendem a ler e a escrever, mas não incorporam a prática da leitura e da escrita, não necessariamente adquirem competência para usar a leitura e a escrita, para envolver-se em práticas sociais de escrita: não fazem leituras de jornais e revistas, não sabem redigir documentos (requerimento, declaração, ofício), não sabem preencher formulários, sentem dificuldade para escrever um simples bilhete, uma carta, não conseguem encontrar informações num catálogo telefônico, num contrato de trabalho, numa conta de luz, numa bula de remédio.
Assim como alfabetizar é fazer decodificar e codificar através da leitura e da escrita, letrar (termo mais amplo) seria a ação de levar os indivíduos ao letramento (prática social). A alfabetização, bem como a escolarização formal são apenas tipos de letramento. Assim, teríamos alfabetizar e letrar como duas ações distintas, mas não inseparáveis. O ideal seria ensinar a ler e a escrever levando às práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o indivíduo se tornasse alfabetizado e letrado ao mesmo tempo.
Nessa perspectiva, alfabetização e letramento são vistos como as duas faces de uma mesma moeda: “Enquanto a alfabetização se ocupa da aquisição da escrita por um indivíduo, ou grupo de indivíduos, o letramento focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição de um sistema escrito por uma sociedade” (Tfouni, 1995. p.20. In.:www.semana.org.br)
Não é fácil nem simples diferenciar o alfabetizado do letrado, porque há muitas variações de acordo com as condições sociais e históricas. Há indivíduos, que embora sejam alfabetizados e até mesmo com alta escolaridade, não contribuem para mudanças efetivas na sociedade, ao contrário, são mantenedores de ideologias pré-determinadas porque não são capazes de analisar (fazer a leitura) dos fatos reais. Mas o fato é que nós despertamos para a necessidade de que o alfabetizado seja também letrado, haja vista a mudança no direcionamento da pergunta do Censo nas últimas décadas para classificar os analfabetos (se o indivíduo sabe assinar o nome ou se é capaz de ler e escrever um bilhete simples. Isso demonstra claramente uma preocupação rumo às concepções de letramento (usos sociais da escrita) e exige mais do alfabetizado do que o simples fato de saber desenhar o nome.
Uma das condições (mas não a única) para que se efetive o letramento é o acesso à escola e aos bens culturais (música, cinema, teatro ...), pois é fato que ao aprender a ler e a escrever as pessoas ambicionem mais que isso, em função da motivação que as levaram a ser alfabetizadas. Porém, a falta de material de leitura, tanto nas escolas quanto nas residências dos próprios alfabetizandos, dificulta o processo do letramento ideal, pois não são dadas as condições necessárias ao aprendiz de colocar em prática suas potencialidades rumo ao próprio letramento, pois só quando as pessoas têm acesso à leitura e à escrita, têm acesso aos livros, revistas e jornais, têm acesso às livrarias e bibliotecas, vivem em tais condições sociais que a leitura e a escrita têm uma função para elas e tornam-se uma necessidade e uma forma de lazer, caso contrário, todo o trabalho de alfabetização fatalmente convergirá para a formação de analfabetos funcionais.
Os estudos sobre letramento ganharam importância no momento em que a escrita passou a ser introduzida/exigida nas sociedades industrializadas de forma mais significativa, transformando, assim, as relações entre os indivíduos e o meio em que vivem. Daí, então, os estudos do letramento preocupavam-se em examinar a expansão da sociedade que, de certa forma, acompanhou a introdução e o desenvolvimento dos usos da escrita pela emergência da educação formal, pela necessidade de formação de identidades nacionais, pelas mudanças sócio-econômicas, entre outros fatores.
Os novos estudos do fenômeno letramento sugerem dois modelos: o modelo autônomo e o modelo ideológico
No modelo autônomo, a escrita é vista como uma ferramenta neutra que pode ser aplicada de forma homogênea, com resultados igualmente homogêneos em todos os contextos sociais e culturais. Segundo esse modelo, o letramento é um produto completo em si, descontextualizado, com uma ação valorizada da escrita e que leva ao mito do letramento, “uma vez que a nossa sociedade valoriza justamente aquilo que é postulado como característico do pensamento transformado pela escrita”. Esse mito vem reproduzindo uma ideologia sobre o letramento, fazendo supor que este garantiria o progresso político e econômico, o igualitarismo, a ascensão social, a manutenção das características da espécie, a disbribuição da riqueza, o aumento da produtividade, a emancipação da mulher e o avanço espiritual. (cf. Kleiman, 1995. p.34- 36).
Todos esse fatores desqualificam o modelo autônomo por ser discriminatório contra o “iletrado” e por ser baseado em textos escritos em detrimento da oralidade.
O modelo ideológico de letramento se opõe ao modelo autônomo, pois privilegia as práticas de letramento em si, das quais a escola é apenas uma das agências. É situado, contextualizado, evidenciado nas relações de poder e na cultura. O foco de estudo é o próprio evento de letramento como situação de escrita. Marcado pela autoria de um sujeito que constrói sua posição no mundo. Esse modelo é uma alternativa, uma visão menos preconceituosa e mais crítica que dá mais relevância a fatores culturais. Os trabalhos de Heath (1982) e Scribner & Cole (1981), entre outros, podem ser enquadrados nesse modelo de letramento, que considera a leitura e a escrita como parte de atividades sociais, tais como ler um manual ou pagar contas. Daí a importância de se encarar a leitura e a escrita não só como atividades com um fim em si mesmas, mas como atividades que servem a um propósito. (KLEIMAN, 1995. p.26-46)
A visão do sujeito no modelo ideológico de letramento é a de que cada pessoa está inserida em uma prática social de leitura e escrita, se posiciona de acordo com realidade social de cada participante. Aceitar a possibilidade da aprendizagem da leitura e da escrita como simples codificação/ decodificação, significa negar a participação do sujeito que está se alfabetizando, seu papel ativo, no processo de aquisição das habilidades necessárias à leitura e escrita.
É importante o enfoque da pesquisa em língua materna que deixa de preocupar-se apenas com as questões sobre ensino-aprendizagem no contexto escolar, e vai para além dos muros da escola, para a sociedade, onde as pessoas precisam desenvolver os conhecimentos adquiridos na instituição escolar em seus relacionamentos pessoais. A partir desse enfoque, começa-se a questionar a formação do professor alfabetizador e do professor de língua materna enquanto agentes de letramento na comunidade. Nem sempre esses agentes estão familiarizados com as práticas de letramento e repassam a hipervalorização do saber letrado que por vezes leva à exclusão social de indivíduos que, à sua maneira, têm a contribuir para nossa coletividade, mesmo à margem do mundo letrado.
Mas é preciso ser cauteloso ao afirmar que um adulto pode ser analfabeto e letrado, não saber ler nem escrever, mas usar a escrita ditando uma carta, por exemplo (não sabe escrever, mas conhece as funções da escrita). Uma criança, que vive num contexto de letramento, que convive com livros, que ouve histórias lidas por adultos, que vê adultos lendo e escrevendo, pode ainda não ser alfabetizada, mas ser letrada.
É certo que essas são práticas de letramento, mas não se pode negar também as contribuições do modelo autônomo e a partir desse fato aceitar a desqualificação da aprendizagem da leitura e da escrita que esse pensamento levado ao extremo pode desencadear. Bem como também não se pode desqualificar o sujeito político (político aqui não quer dizer político partidário, mas o ser político cidadão) por ser ele um analfabeto. O analfabeto adulto pode muito bem ser um indivíduo atuante, porém, pela sua condição de analfabeto ele pode vir a ser tratado como um ser à margem da sociedade letrada, e ele próprio reconhece isso porque “não é assim ingênuo como parece”.(RATO, (s/d). p.267).
A alfabetização e a escolarização não esgotam as possibilidades de letramento, o processo de letramento na perspectiva social deve ser a porta de entrada para a formação de leitores e escritores que desenvolvam o desejo de continuidade de escolarização permanente e de intervenções nas práticas socioculturais, até porque, a função social da leitura e da escrita não é definida somente por quem está alfabetizando.
Seria muito proveitoso que os professores compreendessem que alfabetização e letramento são processos inseparáveis. Não é possível ensinar a ler/ escrever dissociado de práticas sociais de uso da leitura e da escrita. Assim como deveria ser função da escola o compromisso efetivo com o processo de alfabetização/letramento, cujo objetivo não deveria ser apenas ensinar a ler e escrever, mas também levar as crianças a fazer uso da leitura e escrita, a envolver-se em práticas sociais de leitura e escrita.
O letramento permitirá aos indivíduos fazer uso das novas tecnologias de informação, na construção e significação de textos, aprender de forma colaborativa e transitar de maneira crítica e coerente nos novos espaços trazidos pela pós-modernidade, pois o uso da tecnologia moderna é uma opção para o sujeito letrado. Isso é também um direito da cidadania (utilizar os vários recursos que a linguagem tecnológica oferece) e quem não domina a escrita não tem essa opção de escolha. Por isso, o cidadão deve ter facilidade para compreender e produzir textos escritos quanto tem para compreender e produzir textos orais.
A aprendizagem das modalidades da língua, portanto, tem que estar visando a ação do sujeito na/pela linguagem.

2. Tendências atuais para o ensino de Língua Portuguesa
As discussões sobre o ensino de Língua Portuguesa têm se intensificado nos últimos anos devido ao aperfeiçoamento dos conceitos de “gêneros do discurso” e “formação do professor”. A este último, podemos associar discussões sobre metodologias do ensino de produção textual, que foram colocadas em foco nas discussões sobre a educação escolar.
Estas discussões são bastante complexas e freqüentemente nos deparamos com abordagens diferentes para tratá-las.
Houve várias tendências de orientação para o ensino da produção textual nas últimas décadas. Segundo artigo de Bonini (2002 p.25-50), “há, na atualidade, duas fortes vertentes: a interacionista – que postula a produção textual como a reprodução de um corpo de tradições de uma comunidade – e a enunciativista – que a entende como trabalho e exercício de subjetividade na linguagem”. A segunda vertente tem sido a mais aceita, inclusive foi a perspectiva que norteou a criação dos Parâmetros Curriculares Nacionais. No artigo de Bonini acerca do percurso histórico das metodologias de produção textual e da discussão do papel dos modelos psicolingüísticos na metodologia enunciativista fica clara sua crítica no que diz respeito a uma concepção abstrata de sujeito dessa metodologia.
O quadro geral da produção textual nas escolas não é dos melhores, como apontou Pécora (1992) em pesquisa feita no ano de 1981. Isso impulsionou, segundo Bonini (2002, p.27) “uma virada pragmática no ensino de língua materna”, resultado de uma observação maior a respeito do funcionamento da linguagem, que teve a contribuição de uma série de perspectivas teóricas para dar conta desse novo modo de perceber a linguagem.
A realidade do ensino nas escolas brasileiras não evoluiu tanto quanto os estudos acerca do ensino/aprendizagem de língua materna, primeiro porque os docentes ainda não se conscientizaram de que língua não se ensina, aprende-se; que os alunos não são uma tabula rasa no que diz respeito à língua, pois são falantes dela. Embora a escola tenha que ensinar a modalidade escrita em sua variante padrão, esta não é o único objeto de ensino de funcionamento da língua; e o professor precisa ser um importante agente para a mudança do tipo de ensino que se estagnou em nosso meio (um ensino prescritivista). Para isso, basta que queira reformular suas concepções a respeito de suas próprias habilidades como educador.
Dentro desse pensamento, e como não há receitas para uma prática que seja 100% eficiente, voltaremos nossa atenção para a importância da formação do professor.
No mundo contemporâneo, o papel do professor está constantemente sendo questionado e precisando ser redefinido, frente às novas concepções sobre a educação, atualizadas pelas novas teorias. Por isso, muitos professores não estão preparados para enfrentar as exigências impostas pelo novo cenário educacional. “Orientar e mediar o ensino para a aprendizagem dos alunos; responsabilizar-se pelo sucesso da aprendizagem dos alunos; assumir e saber lidar com a diversidade existente entre os alunos; incentivar atividades de enriquecimento curricular; elaborar e executar projetos para desenvolver conteúdos curriculares; utilizar novas metodologias, estratégias e materiais de apoio; desenvolver hábitos de colaboração e trabalho em equipe” são apenas algumas das competências exigidas aos docentes. “Nesse contexto, a formação inicial como preparação profissional tem papel crucial para possibilitar que os professores se apropriem de determinados conhecimentos e possam experimentar, em seu próprio processo de aprendizagem, o desenvolvimento de competências necessárias para atuar nesse novo cenário. A formação de um profissional de educação tem que estimulá-lo a aprender o tempo todo, a pesquisar, a investir na própria formação e a usar sua inteligência, criatividade, sensibilidade e capacidade de interagir com outras pessoas.” (DIRETRIZES para a formação inicial de professores da educação básica, em cursos de nível superior, 2000).
É claro que diante dessa exigência é preciso que haja uma reformulação nos cursos de formação do professor, mas isso não depende dele. Então, o que fazer?
Há uma grande distância entre o professor ideal e o professor que atua nos dias de hoje, e mesmo aqueles que querem reformular e atualizar suas práticas em sala de aula, esbarram em uma série de dificuldades que só poderiam ser sanadas com um trabalho de conscientização entre todos os envolvidos no processo educacional. O professor precisa adotar práticas que ressignifiquem o ensino de seus alunos de forma que eles entendam seu papel no mundo O bom professor seria aquele que é voltado para a “construção de uma cidadania consciente e ativa, que ofereça aos alunos bases culturais que lhes permitam identificar e posicionar-se frente às transformações em curso e incorporar-se na vida produtiva.” (Diretrizes, 2000). Outra das dificuldades que o professor enfrenta nesse processo é que alguns alunos acomodados ao tipo de sistema tradicional e prescritivo resistem a uma mudança que exija mais dele como um ser responsável pelo próprio aprendizado.
Junto a esses comportamentos (o do professor e do aluno) haveria de existir uma parceria entre os coordenadores pedagógicos e a direção da escola no sentido de apoiar iniciativas que fugissem às práticas prescritivas.
Segundo as Diretrizes (2002) “embora todas as políticas que se destinam a prover as condições básicas para o funcionamento da escola sejam importantes, só professores que assumam, na prática, os princípios da reforma poderão garantir o bom uso dos materiais, fazer do desenvolvimento curricular um processo vivo e dar à gestão educacional a dimensão pedagógica da qual ela tanto se ressente nos dias de hoje”.
Dentro da teoria enunciativista com o auxílio da psicolingüística o aluno deve passar a trabalhar a auto-observação no trabalho com a linguagem e “como construtor de linguagem passa a olhar para seu papel na interação, do qual seu conhecimento de língua será uma decorrência.”(Bonini, 2002). O professor precisa fazer ajustes entre o que planeja e aquilo que acontece na interação com os alunos e esses ajustes são feitos geralmente em tempo real e se isso não for feito, pode-se correr o risco de passar a oportunidade e o processo ensino/aprendizagem ficar prejudicado. Os resultados das ações da interação na sala de aula também podem ser imprevisíveis porque o contexto é complexo e indeterminado, o que dificulta a antecipação do resultado final, ou seja, não se pode avaliar se uma prática vai ser bem sucedida ou não. “Situações escolares de ensino e aprendizagem são situações comunicativas, nas quais alunos e professores coparticipam, concorrendo com influência igualmente decisiva para o êxito do processo.” (Diretrizes 2002)
Sendo assim, o professor deve trabalhar com um planejamento prévio sim, mas em função de uma possível mudança (um replanejamento) sempre de acordo com as necessidades do aluno na interação em sala de aula, visando os propósitos dessa interação em pleno acordo com as necessidades da comunidade, sua finalidade, seus valores, levando em conta características, anseios, necessidades locais.e da sociedade em que ela se insere. Só assim o aluno compreenderá o funcionamento de uma comunicação autêntica e não uma pseudo-comunicação, formada com modelos artificiais da gramática normativa.
A visão interpretativista da Lingüística Aplicada investe na intersubjetividade, ou seja, nos significados que as pessoas constroem, destroem e reconstroem em suas interações, sendo “a intersubjetividade que possibilita chegarmos mais próximo da realidade que é construída pelos atores sociais (...). O foco é, então, colocado em aspectos processuais do mundo social em vez do foco em um produto padronizado”.(Moita Lopes, 1994, p.332)
“Um tema de presença marcante no debate atual, nacional e internacional sobre a crise e a reconstrução da identidade de professor é a necessidade de se assumir a dimensão profissional de seu trabalho, em contraposição à visão de sacerdócio” e ainda “se a reforma da educação básica aponta para uma formação voltada à construção da cidadania, que incorpore o tratamento de questões sociais urgentes, isso não poderá ser realizado se os professores de todos os segmentos da escolaridade não tiverem uma sólida e ampla formação cultural” (Diretrizes,2000). Por isso, se o curso de formação não proporcionou a instrumentalização necessária para que o profissional docente se alinhe a esse novo perfil, é preciso que ele não abra não da pesquisa e dos cursos que proporcionarão a abertura de novos horizontes nesse sentido.
Porém, a pesquisa que o professor deve fazer não pode ser confundida com a pesquisa puramente teórica, mas deve ser, antes de qualquer coisa, uma atitude cotidiana de busca de compreensão dos processos de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos e à autonomia na interpretação da realidade e dos conhecimentos que constituem seus objetos de ensino. É claro que a investigação acadêmica contribuem para o desenvolvimento profissional para que ele compreenda os fenômenos e possa fazer as escolhas das metodologias de uma maneira mais acertada e também o mantém atualizado, porém, de nada vale o professor estar cheio de saberes teóricos e não saber o que fazer com eles. No que diz respeito ao ensino de língua portuguesa, os saberes produzidos pela Lingüística, são muito úteis, porém, na sala de aula, “o professor produz adaptações, e a noção teórica (como a de texto), tal como formulada inicialmente pela Lingüística, é transformada ou (re)construída, juntamente com outros saberes ou conteúdos, para atender às necessidades da situação (...). Assim, o professor constrói, em sua prática, (...) objetos próprios da situação de ensino”. (RAFAEL, Edmilson Luiz. In: Kleiman, 2001, p.158).
As pesquisas e debates sobre a perspectiva enunciativista está apenas começando, por isso as propostas devem ser bem analisadas. Porém, as discussões já vêm dando resultados com a discussão da noção de gêneros textuais (termo utilizado aqui em seu sentido mais abrangente, grupos de textos - orais ou escritos - com identidade não formal, mas proposicional).

3. Os gêneros discursivos
No que diz respeito aos gêneros discursivos, “os Parâmetros Curriculares para o ensino de língua portuguesa, (...) ressaltam que a partir dos anos 80 é que se estabeleceram mais fortemente as críticas ao modo como se ensinava língua portuguesa, na escola. Tal fato desencadeou a proliferação de pesquisas “produzidas por uma lingüística independente da tradição normativa e filológica e os estudos desenvolvidos em variação lingüística e psicolingüística, entre outras, possibilitaram avanços nas áreas de educação e psicologia da aprendizagem, principalmente no que se refere à aquisição da escrita”(p.17). Além disso, acrescentam que mesmo imperando, ainda, uma posição “corretiva’ e preconceituosa em relação às formas canônicas de expressão lingüística, as propostas de transformação do ensino de Língua Portuguesa consolidaram-se em práticas de ensino em que tanto o ponto de partida quanto o ponto de chegada é o uso da linguagem” (p.18).
Neste sentido, postulam que “o domínio da linguagem, como atividades discursiva e cognitiva, e o domínio da língua, como sistema simbólico utilizado por uma comunidade lingüística, são condições de possibilidade de plena participação social. (...) (p.19) Assim, sem deixar de considerar os conhecimentos que o aluno traz para a escola, esta deve promover sua ampliação, fazendo com que nos oito anos que correspondem ao Ensino Fundamental, “cada aluno se torne capaz de interpretar diferentes textos que circulam socialmente, de assumir a palavra e, como cidadão, de produzir textos eficazes nas mais variadas situações”(idem: 19).” (apud MESSIAS In: www.smec.salvador.ba.gov.br. Partindo desse texto dos Parâmetros, Messias (In: www.smec.salvador.ba.gov.br) em seu artigo defende a produção oral e leva em consideração que a língua é uma atividade social por meio da qual veiculamos informações, a priori, via oralidade, portanto a língua é um conjunto de usos concretos que envolvem sempre um locutor e um interlocutor interagindo com um propósito e localizados em um espaço particular, por isso defende o uso de uma gramática funcional que analisa a comunicação dentro das situações em que ela emerge, porque essa visão funcionalista faz com que reflitamos mais sobre a língua que falamos sem nos preocuparmos com critérios classificatórios e além disso, nos faz descobrir a importância da língua falada para auxiliar o ensino/aprendizagem da língua em sua modalidade escrita.
Embora haja muitas teorias e diretrizes nesse sentido, nossas escolas ainda abrem espaço para o conteudismo que não leva à reflexão, formando cidadãos que ”embora saibam ”ler e escrever”, não são capazes de apreender o conteúdo veiculado no texto escrito, por vários motivos, que vão desde o desconhecimento do vocabulário até a incapacidade de contextualizar uma mensagem, passando pela dificuldade em perceber um conteúdo metafórico, por exemplo.” (Monteiro, s/d)
Se para a aquisição da linguagem basta apenas a exposição da criança a contextos comunicativos, por que não se aproveitar dessa tática na escola para ensinar a língua escrita?
A situação de ensino na escola é bem diferente (agora dependente de sistematização), mas para ensinar a escrita, é necessário imitar um passo básico da aquisição da linguagem: expor o aprendiz a situações de contato com textos de gêneros diversos, circundantes à sua volta. Só assim poderemos fazê-lo compreender a utilidade da escrita em nossos dias, propiciando assim uma ampliação de sua capacidade comunicativa ao compreender e produzir textos sob suas diversas formas de utilização prática. O aluno deve aprender conteúdos de natureza bastante diferente como escrever diferentes tipos de texto e dominar o diálogo como instrumento argumentativo.
Conforme Gonçalves (s/d) em seu artigo para a Universidade Estadual Paulista, na escola, “com relação à produção de textos, a instituição deve aproximar a escrita tal como ela ocorre em situações de escrita extra-escola. Caso contrário, corre-se o risco de o estudante ter a sua proficiência lingüística prejudicada”.
Por isso, na sala de aula é preciso adotar uma posição interacionista para afetivar os ensinamentos sobre a linguagem, tanto na modalidade oral quanto na escrita bem como suas adequações conforme o código utilizado em suas situações formais ou informais. Daí a necessidade de um interlocutor real, que o ato da escrita também exige. Para que haja uma boa produção textual é preciso que o estudante “se desvencilhe da sua solidão, no ato de escrever, e tenha uma imagem do seu destinatário. Caso contrário, é possível que seu texto signifique menos do que pretendia seu autor” (Gonçalves, s/d). Esse direcionamento dos textos a destinatários reais é uma realidade dos diversos gêneros existentes no universo das culturas escritas.
Segundo “Bronckart (1994), os gêneros constituem ações de linguagem que requerem do agente produtor uma série de decisões que ele necessita ter competência para executar: a primeira delas é a escolha que deve ser feita a partir do rol de gêneros existentes, em que ele escolherá aquele que lhe parece adequado ao contexto e à intenção comunicativa; e a segunda, é a decisão e a aplicação que poderá acrescentar algo à forma destacada ou recriá-la.” (apud Carvalho, s/d)
Os gêneros nascem, portanto, dos universos discursivos latentes em cada situação de interação porque a todo instante o indivíduo apresenta uma soma de possibilidades que aos poucos vai se materializando conforme as necessidades de expressão.
“Segundo Bakhtin (1953), o conhecimento dos gêneros discursivos envolve, entre outras coisas, saber que tipo de texto pode ser atualizado numa dada situação comunicativa. O gênero (da escrita) escolhido para a aula pode ser interpretado como um dos recursos comunicativos para a organização do plano didático da professora (...). A seleção, integração, complementariedade e explicitação do gênero evidenciadas na fala da professora – na sua oralidade letrada – estariam correlacionados com sua capacidade, tanto intuitiva como formalmente adquirida, de uso da linguagem nas diversas situações didáticas”. (cf. Kleiman, 2002, p.6)
Um gênero discursivo não é definido apenas pela forma, é muito mais reconhecido pela sua funcionalidade. A condições necessárias para delinear os gêneros discursivos deveriam ser: a situação de produção textual, o tema, a forma composicional e as marcas lingüísticas. Por outro lado, a escolha para a produção de um determinado gênero deveria levar em conta os objetivos visados na comunicação, o lugar social onde ela se estabelece, os papéis dos participantes e a adaptação ao modelo de gêneros considerando o contexto de uso e os interlocutores. (Bronckart,1994 apud Carvalho, s/d)
A questão do gênero discursivo é um assunto complexo, mas é preciso tratar desse assunto vinculado à formação do professor, pois é a partir de sua prática discursiva em sala de aula que farão com que seus alunos encontrem razões para aprender a ler e a escrever com proficiência, sempre visando aspectos interacionais de formulação, reformulação e adequação dos tipos textuais que compõem os gêneros.

Conclusão
Este estudo buscou compreender as práticas de letramento, já que o próprio termo letramento utilizado neste artigo, não se estende apenas à escrita adquirida através da escola (a alfabetização), sendo que ele se realiza sob diversas manifestações sociais em que a escrita é apenas uma das suas formas.
A escrita ocupou por muito tempo um lugar de supremacia sobre a oralidade, porém hoje não se pode falar de questões de letramento sem prescindir da linguagem oral como prática social e cultural distinta mas complementar da realização em linguagem escrita.
Na atualidade, os cursos de formação de professor dão grande ênfase ao pedagogismo ou ao conteudismo exacerbado sem considerar a relevância da aplicação de uma metodologia e sua relação com os conteúdos que deverá ensinar. É necessário, portanto, dar importância à pesquisa tanto por parte do professor quanto por parte do aluno, principalmente para fazer as adaptações aos contextos situacionais do cotidiano da escola.
Só com o conhecimento da realidade é que se pode retirar da educação formal proveito para as diferentes situações com que professor e aluno se deparam. Favorecendo uma cultura geral ampla é possível alcançar o desenvolvimento da sensibilidade e da imaginação, melhorando a possibilidade de produzir significados e interpretações do que se vive para ligar ao conteúdo estudado e potencializar a qualidade da educação formal. A atualização do conceito de gêneros do discurso e as novas tendências metodológicas sobre o ensino de língua portuguesa só vêm contribuir para uma nova conscientização sobre as questões de letramento, minimizando assim o preconceito contra as pessoas que não tiveram acesso a uma educação formal que o inserisse no mundo da escrita.
Para ser um indivíduo letrado, não basta apenas ser alfabetizado (no sentido de ser capaz de codificar e decodificar a linguagem escrita apenas). Precisamos entender a alfabetização como um dos processos de letramento e que ela passa, portanto, inevitavelmente pelo contato sistematizado com o código escrito, o que pode ocorrer dentro ou fora do ambiente escolar segundo Monteiro, (s/d).
Por mais que o professor e os materiais didáticos contribuam para que a aprendizagem se realize, é o próprio aluno que tem a tarefa de construir significados sobre os conteúdos que aprende, modificando-os e enriquecendo-os para construir novos e mais fortes instrumentos de ação.
Por outro lado, para atuar com profissionalismo o professor não só deve dominar conhecimentos específicos em sua área, mas também resolução e autonomia para tomar decisões com responsabilidade. Requer ainda que saiba avaliar criticamente a própria prática dentro do contexto do seu local de trabalho e saiba interagir cooperativamente com os colegas, direção, alunos, enfim, com toda a comunidade escolar.
Apesar dos limites que envolveram a produção deste trabalho e pelo modo simples com que apresentamos estas discussões, esperamos que este estudo desperte reflexões sobre os preconceitos com as populações excluídas devido ao seu afastamento da cultura dita “letrada” dentro da visão de letramento aqui apresentada, bem como o reconhecimento dos mitos que sustentaram até hoje a nossa prática social, além de alargar nossos horizontes quanto aos gêneros do discurso (assunto muito discutido na atualidade, mas também muito controverso).


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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REFERÊNCIAS ELETRÔNICAS:

MODERNA. Disponível em: <<>> Acessado em: 09/07/2005.

SEMANA. Disponível em: <<>> Acessado em: 09/07/2005.

Quando o oral interfere no escrito

QUANDO O ORAL INTERFERE NO ESCRITO:
UMA ANÁLISE DE REDAÇÕES ESCOLARES DE ALUNOS DA EJA*

Rosália de Oliveira SOARES (Universidade Federal do Pará)


RESUMO: Este artigo, fundamentado na Lingüística Textual e nas noções de gênero textual, objetiva analisar a interferência da linguagem oral em textos escritos por alunos do ensino médio para sugerir reflexões sobre a (in)eficiência dos métodos de ensino-aprendizagem da língua portuguesa. Para melhorar o domínio da linguagem escrita, levanta-se a hipótese de que é necessário dispensar mais tempo em sala de aula para o ensino-aprendizagem de textos orais dos chamados gêneros públicos.

PALAVRAS CHAVE: Lingüística textual; Gêneros textuais; Oralidade; Escrita

1 Introdução
É comum ouvir reclamações de professores, de qualquer nível de ensino, a respeito da qualidade das produções textuais dos alunos. Esse é um fato que vem alarmando a comunidade docente e dando margem a diversos trabalhos na área da Lingüística Textual. Dentre esses trabalhos podemos citar: Pécora (1986) – que analisou alguns dos problemas de redação na produção escrita de vestibulandos e alunos de 1º ano de cursos universitário, apontando, como resultado de sua análise, 13 problemas principais; Rocha (In: MOARA, 1998) – que analisou a progressão textual de alunos de 5ª série e Bastos (2001) – que teve como objeto de análise textos narrativos escritos por alunos da 2ª série do ensino médio (antigo 2º grau), dos quais analisou a coesão e a coerência, levando em consideração (além do modo como elas se estabelecem nos textos narrativos escolares) os fatores que prejudicam estes dois elementos da textualidade na produção discente.
Seguindo as tendências de análise decorrentes das preocupações docentes, como as apontadas acima, este trabalho propõe uma análise das interferências da oralidade na produção escrita de alunos do ensino médio em turma de aceleração de estudos (EJA), 2ª etapa, que corresponde, no currículo escolar, à clientela que deve receber como conteúdo do ensino de Língua Portuguesa parte do programa de 2ª série mais o programa da 3ª série de um curso regular. Essa situação por si só já é bastante delicada, levando-se em consideração que mesmo em uma turma regular o professor não consegue cumprir a programação curricular integralmente no ano letivo.
Imaginemos então como é o processo ensino-aprendizagem em uma turma de aceleração cujos programas se acumulam, pois nesse tipo de ensino, baseado em currículos e programas previamente estabelecidos e prescritos a toda uma comunidade escolar, como se ela fosse homogênea. Sendo assim, o aprendizado da língua portuguesa fica totalmente comprometido, tanto por conta do repasse apenas de conceitos gramaticais para serem decorados (ensino de metalinguagem) quanto pela falta de tempo para se trabalhar efetivamente uma produção que atenda às exigências de uma situação de interação concreta, que possa contribuir para melhorar a competência comunicativa dos alunos.
Outro fato inegável e que geralmente não é levado em consideração no momento do ensino-aprendizagem de língua portuguesa é o de que os alunos, em geral, já dominam os mecanismos da linguagem oral e sabem organizar textos a partir dessa modalidade da língua nas situações apresentadas em seu dia-a-dia. O que parece estar faltando é aumentar as possibilidades de comunicação oral do educando nos gêneros orais públicos, através dos quais ele possa exercitar uma variante oral mais aproximada da língua padrão, além de perceber uma utilização concreta para tal linguagem.
Por isso, a proposta deste trabalho é investigar até que ponto a limitação da expressão oral que os alunos possuem interfere em sua produção escrita na escola.

2 Pressupostos teóricos
Sob a perspectiva apresentada anteriormente e para atingir os objetivos traçados, é necessário explicitar a fundamentação teórica que permeia este trabalho de análise, entre as quais não podemos prescindir: a noção de tipos e gêneros textuais dentro da perspectiva do ensino bem como a distinção clara entre as modalidades escrita e oral da língua, pois é através de textos orais e escritos que os usuários de uma língua se comunicam.

2.1 Tipos e gêneros textuais
O ensino da produção textual nas escolas, até recentemente era feito por meio dos tipos de textos (narrativos, descritivos e dissertativos) como se eles fossem únicos e não apresentassem nenhuma dificuldade em sua esquematização didática. Sendo assim, o processo tradicional para ensinar “redação”, consistia em ensinar primeiro a narração e a descrição (por se suporem práticas mais fáceis) e depois a dissertação (preconceituosamente considerada uma prática mais difícil e por isso mesmo reservada às séries finais). Essa prática, infelizmente, ainda hoje se pode encontrar ativa em algumas escolas brasileiras.
O ensino baseado na tipologia textual é bastante limitado, pois exclui outros tipos existentes e não prepara o aluno para o domínio discursivo social, já que não o expõe aos objetivos primordiais da comunicação que são: a necessidade (propósito) de falar ou escrever sobre algo (assunto) que seja do interesse de alguém (interlocutor real). Na escola, o aluno geralmente escreve para que o professor corrija e atribua uma nota, sempre se baseando em um único modelo didático de um dos tipos textuais “ensinado” pelo professor.
Devido a essa limitação no trabalho feito somente a partir dos tipos textuais, fez-se necessário voltar-se a outras bases de ensino: os gêneros textuais. Nesse campo, os trabalhos atuais partem dos estudos de Bakhtin que se refere a “gêneros” sempre no plural, devido a sua diversidade infinita porque seu repertório “cresce e se diferencia à medida que se desenvolve e se complexifica um determinado campo” e os conceitua como “tipos relativamente estáveis de enunciados” devido sua heterogeneidade funcional. (BAKHTIN, 2003:262)
Se os textos escritos ou orais que produzimos são diferentes, isso se deve ao fato de que são produzidos em condições diversas e a partir de relações interpessoais também distintas. Segundo Angelim & Silva (2005:161): “Os gêneros refletem práticas discursivas variadas: ainda que cada usuário imprima um modo próprio a seu estilo de comunicar-se, as características de realização deste ato de comunicação enquadra-se numa classe, conforme o objetivo e conforme as diferentes relações sociais que motivaram a comunicação dos participantes do ato linguageiro.”
Sendo assim, a variabilidade nos modos de expressão, tanto orais quanto escritos se apresentam de forma concreta, pois se distinguem por vários fatores, tais como: o momento da interlocução, o local da atividade lingüística, sua extensão, o suporte e os modos de difusão, além do propósito comunicativo, do assunto, da existência de um interlocutor real e das relações que se mantém entre os interlocutores a cada espaço e momento. Tudo isso associado a um modo de organização do discurso (tipo textual).
O interesse pela teoria dos gêneros tem crescido bastante nos últimos tempos e vem adquirindo grande relevância em várias áreas de estudo, sobretudo às relacionadas aos estudos lingüísticos (como a Lingüística Textual, a Sociolingüística, etc) e às que se dedicam ao ensino aprendizagem de línguas (materna ou estrangeira).
Os gêneros textuais vem sendo contemplados nos currículos escolares desde a divulgação dos Parâmetros Curriculares Nacionais, que apresentam propostas de trabalho com uma diversidade de textos e valorizam a participação ativa e crítica do aprendiz no processo ensino-aprendizagem, principalmente o domínio das variedades do idioma em cada gênero específico. De acordo com Santos (In: PAULIUKONIS & GAVAZZI, 2005:173) apesar das críticas, “por vezes fundamentadas”, que consideram os PCN “como impositivos e fora da realidade brasileira, (...) não se pode negar que os Parâmetros têm o seu valor e vem servindo, ao menos, para levantar o debate a respeito do ensino de língua portuguesa”. Pois no que diz respeito aos pressupostos da Lingüística Textual e as discussões sobre variação lingüística, os Parâmetros estão no caminho certo, pois esses temas que, segundo Santos, “acontecem, nas faculdades de Letras, desde os primeiros períodos do curso”. Então, a má acolhida deles por quem está atuando em sala de aula demonstra a má formação de nossos profissionais da educação, já que a maioria das idéias defendidas nos PCN, no que diz respeito ao ensino de língua portuguesa, são resultados da sistematização e apropriação de toda a evolução dos estudos lingüísticos divulgados na atualidade.
No que diz respeito ao ensino-aprendizagem, segundo Schneuwly (In: KOCH, 2004:164-165),

“na concepção de gênero, estão contemplados os elementos centrais caracterizadores de toda atividade humana: o sujeito, a ação e o instrumento. Segundo ele, o gênero pode ser considerado uma ferramenta, na medida em que os sujeitos – enunciadores – agem discursivamente numa situação definida – a ação – por uma série de parâmetros, com a ajuda de um instrumento semiótico – o gênero”.

E ainda:

“O autor desenvolve a metáfora do gênero como “megainstrumento”, constituído de vários subsistemas semióticos, para agir em situações de linguagem. (...) O ensino dos gêneros seria, pois, uma forma concreta de possibilitar o poder de atuação aos educadores e, por decorrência, aos seus educandos. Isto porque a maestria textual requer (...) a intervenção ativa de formadores e o desenvolvimento de uma didática específica”.

Para Dolz, Noverraz & Schneuwly (In: SCHNEUWLY &DOLZ et al. 2004:95-127), é perfeitamente viável o ensino através dos gêneros textuais, mas para isso é necessário que o professor seja criativo e perspicaz para selecionar os textos (orais ou escritos) que servirão de modelo para cada “seqüência didática” a ser desenvolvida em sala de aula. Segundo os autores, para elaborar uma seqüência didática baseada nos gêneros textuais é preciso “permitir aos alunos o acesso a uma cultura suficiente no domínio da produção de textos orais e escritos”, bem como considerar que “a escolha de determinados gêneros dentro dos agrupamentos é feita em função de critérios de progressão através dos diferentes ciclos/séries ” (...). Sendo assim:

“O trabalho escolar será realizado, evidentemente, sobre gêneros que o aluno não domina ou o faz de maneira insuficiente; sobre aqueles dificilmente acessíveis, espontaneamente, pela maioria dos alunos; e sobre gêneros públicos e não privados (...). As seqüências didáticas servem, portanto, para dar acesso aos alunos a prática de linguagem novas ou dificilmente domináveis.” (In: SCHNEUWLY &DOLZ et al. 2004:97-98)

Os gêneros necessitam de competências do agente produtor que partem desde escolha mais adequada de um gênero, dentre os existentes, a um contexto e a uma dada intenção comunicativa; até a recriação de um gênero para que ele possa adequar-se a uma nova situação. É papel da escola promover o desenvolvimento dessa competência, e para isso é necessária uma melhoria na competência do próprio professor para que ele possa elaborar seqüências didáticas factíveis em sua classe.

“Segundo Bakhtin (1953), o conhecimento dos gêneros discursivos envolve, entre outras coisas, saber que tipo de texto pode ser atualizado numa dada situação comunicativa. O gênero (da escrita) escolhido para a aula pode ser interpretado como um dos recursos comunicativos para a organização do plano didático da professora (...). A seleção, integração, complementariedade e explicitação do gênero evidenciadas na fala da professora – na sua oralidade letrada – estariam correlacionados com sua capacidade, tanto intuitiva como formalmente adquirida, de uso da linguagem nas diversas situações didáticas”. (cf. Kleiman, In: Scripta, 2002:06)

Sendo assim, podemos observar que a questão do gênero discursivo é um assunto complexo, mas é preciso tratar desse assunto vinculado à formação do professor, pois é a partir de sua prática discursiva em sala de aula que farão com que seus alunos encontrem razões para aprender a ler e a escrever e a se comunicar oralmente com proficiência, sempre visando aspectos interacionais de formulação, reformulação e adequação dos tipos textuais que compõem os gêneros. Os gêneros nascem, portanto, dos universos discursivos latentes em cada situação de interação porque a todo instante o indivíduo apresenta uma soma de possibilidades que aos poucos vai se materializando conforme as necessidades de expressão.
Em sala de aula, essa necessidade de expressão freqüentemente se reduz à produção de redações escolares, único gênero textual visado. Esses textos têm sempre os mesmos interlocutores (o aluno escreve para o professor) e também as mesmas finalidades (a correção e a nota), embora possam ser apresentados sob diversos modos de produção de discurso (tipos textuais). Exatamente por se tratar de prática freqüente na maioria das escolas brasileiras, escolheu-se o gênero redação escolar como objeto de análise deste trabalho.

2.2 A fala e a escrita
Os Parâmetros Curriculares Nacionais nos apresentam alguns princípios e orientações para o trabalho didático com os conteúdos, e um deles é a utilização de textos orais na sala de aula. De acordo com os PCN para a Língua Portuguesa do terceiro e do quarto ciclos (BRASIL, 1998:67-68), ensinar a língua oral na escola “não significa trabalhar a capacidade de falar em geral. Significa desenvolver o domínio dos gêneros que apóiam a aprendizagem escolar da Língua Portuguesa e de outras áreas (exposição, relatório de experiência, entrevista, debate, etc) e, também, os gêneros da vida pública no sentido mais amplo do termo ...”. E ainda: “Ensinar a língua oral deve significar para a escola possibilitar acesso a usos da linguagem mais formalizados e convencionais, que exijam controle mais eficiente e voluntário da enunciação, tendo em vista a importância que o domínio da palavra pública tem no exercício da cidadania”.(p. 67)
Em outras palavras, desde o ensino fundamental, a escola deve aproveitar a oralidade que o aluno conhece e utiliza em seu dia-a-dia para aperfeiçoá-la, adequando-a a diversas situações de uso. E uma dessas situações diferentes para ele é, com certeza, a situação de falar para um público em uma exposição oral na sala de aula, que precisa ser diferenciada (por se tratar de um novo gênero) do modo como os colegas falam entre si no convívio escolar. Portanto, é necessário ficar bem clara a distinção entre as características da escrita e da fala para o educando, para que ele consiga adaptar suas escolhas em ambas as modalidades da língua nas diferentes situações comunicativas.
Aproveitar a oralidade do cotidiano do aluno não quer dizer aceitar incondicionalmente as características de sua fala em toda e qualquer situação de uso da linguagem, principalmente nas situações mais formalizadas de comunicação oral e escrita, como por exemplo: redações escolares, seminários e exposições orais de trabalhos em sala de aula e outras práticas formais do cotidiano, tais como solicitar tomada de atitude de alguma autoridade, fazer reclamação acerca de produtos ou serviços via telefone ou carta, etc. Já que a escola é um lugar de educação formal e por isso mesmo uma instituição normativa, há de se promover nela meios para o aprendente desenvolver as capacidades de comunicação de modo integral (via oralidade e escrita). Para Dolz, Schneuwly & Pietro, entretanto, “sempre será importante aplicar normas que correspondam à modalidade oral de produção e que não meçam a oralidade pela escrita”. (In: SCHNEUWLY &DOLZ et al. 2004:273)
É importante também não medir a escrita pela fala, pois é evidente que ambas as modalidades de expressão são diferentes, porém não se devem negar suas semelhanças, pois as duas modalidades podem se valer do mesmo sistema e expressar as mesmas intenções, desempenhando funções análogas. Entretanto, o que vai interessar neste estudo, são as características que conferem a cada uma delas especificidades e autonomias próprias.
Sendo necessário centrar-se nas diferenças e não nas semelhanças entre fala e escrita, para este trabalho, vamos entender que, segundo os conceitos de Marcuschi (2003b:25-26):

“A fala seria uma forma de produção textual-discursiva para fins comunicativos na modalidade oral (situa-se no plano da oralidade, portanto), sem a necessidade de uma tecnologia além do aparato disponível pelo próprio ser humano. Caracteriza-se pelo uso da língua na sua forma de sons sistematicamente articulados e significativos, bem como os aspectos prosódicos, envolvendo, ainda, uma série de recursos expressivos de outra ordem, tal como a gestualidade, os movimentos do corpo e a mímica”.

A escrita, por sua vez,

“(...) seria um modelo de produção textual-discursiva para fins comunicativos com certas especificidades materiais e se caracterizaria por sua constituição gráfica, embora envolva também recursos de ordem pictórica e outros (situa-se no plano dos letramentos) (...). Trata-se de uma modalidade de uso da língua complementar à fala”.

Então, fala e escrita são diferentes de acordo com dois pontos de vista distintos:
a. do ponto de vista da percepção: o caráter fônico-prosódico da linguagem oral na fala (a emissão fonemas, a entonação, as pausas, as hesitações, a velocidade de fala, etc.) faz com que a mensagem seja percebida auditivamente sendo que na escrita a mensagem é percebida visualmente;
b. do ponto de vista da situação de comunicação: além dos significantes verbais, da fala participam outros elementos, tais como, a mímica, os gestos, as expressões fisionômicas, etc, que ajudam o interlocutor a interpretar aquilo que ouve. Esses elementos podem completar ou até mesmo substituir o discurso ou parte dele. Já a escrita depende exclusivamente da linguagem verbal, por isso ela não pode ser entendida como uma simples transcrição da fala.

Em função desses dois pontos de vista, a estruturação do texto oral e do escrito se faz de formas diferentes , principalmente devido aos referentes concretos numa “interação centrada” (Goffman apud Marcuschi, 2003a:15) que ocorre entre dois ou mais interlocutores simultaneamente (na fala) ou da ausência deles (na escrita) .
Passemos agora a destacar as características específicas de cada uma dessas modalidades de expressão que serão consideradas na etapa da análise de redações escolares.

2.2.1. Características da fala
A linguagem oral é de caráter primário já que, segundo Marcuschi (2003a:14), “a conversação é a primeira das formas de linguagem a que estamos expostos”, bem como “a conversação é o gênero básico da interação humana” (Levinson, 1983 apud Marcuschi, 2003a:14). A língua falada, cuja função primária é a comunicação direta entre as pessoas no dia-a-dia, também pode ocorrer em situações mais formalizadas de interação. Suas características mais naturais são:
• constantes reformulações: na fala, não se pode “apagar”, mas se pode “retocar” o que foi dito antes, para explicar melhor a intenção comunicativa;
• descontinuidade: freqüentes interrupções, frases inacabadas, falsos começos, truncamentos, hesitações, pausas, repetições, freqüência de palavras como “é”, “bem”, “então”, “aí”, “hein” (marcadores conversacionais ) destinados a manter o contato;
• no caso da conversação, a produção é em co-autoria ;
• é valorizada pela entonação, mímica e pela situação concreta entre os comunicantes (possibilidades de resposta imediata) ;
• espontaneidade: a fala, em geral, é mais livre, não se prende a valores gramaticais rígidos, principalmente em situações informais de uso;
• uso do pronome cópia: cópia de uma informação já expressa por outro elemento dentro do enunciado. Ex.: Aquele menino que eu vi ele ontem. (Aquele menino = ele = mesma função sintática);
• vocabulário estendido pelas criações do povo (neologismos populares) e uso de palavras no sentido genérico, tais como: “coisa”, “negócio”, bem como verbos usados em sentido mais amplo como: “botar”, “fazer”, “ter”, etc.;
• amplo uso de dêiticos na referenciação (isso, aqui, ali, aquele...) no caso da interação face-a-face;
• marcas de intensidade (exageros na expressão) que deixam transparecer a subjetividade (ex.: carrão, apartamentaço, etc.);
• extinção de tempos verbais, como por exemplo o mais-que-perfeito do indicativo e o futuro do pretérito;
• freqüentes reduções de palavras;

2.2.2. Características da escrita
Já a escrita é de caráter secundário e de surgimento bastante posterior ao da fala. Por ter como característica a permanência, tende a ser mais cuidada (formal e conservadora). Pode aparecer em situações de menor grau de formalização. Caracteriza-se por:
• impossibilidade de reformulação: o texto pode ser reformulado apenas no momento da produção, mas depois de dado por terminado e passar para o domínio do interlocutor, não pode ser reformulado, pois o texto não pertence mais a quem escreveu, cabendo ao receptor a avaliação e juízos de valor sobre as idéias ali encerradas;
• exigência de uma organização sintático-semântica mais complexa, tendo em vista a necessidade de compensar, por meio de recursos lingüísticos, a falta de referentes situacionais. Não deve ter mudanças bruscas no pensamento;
• uma interação mais problemática porque o interlocutor recebe o texto já pronto, sem possibilidades de um feed-back imediato;
• necessidade de um desenvolvimento mais amplo e gradual das frases;
• maior atenção à disciplina gramatical ;
• vocabulário específico pela falta de contextualização no real ;
• complexidade no uso dos dêiticos dentro do espaço físico do suporte do texto escrito.

Ao se conhecer a estrutura do discurso falado e de tudo que o envolve, fica mais fácil adequá-lo à modalidade escrita da língua. Porém, no momento de produzir uma redação escolar, objeto de análise neste trabalho, os alunos encontram várias dificuldades no processo de adequação à linguagem escrita, manifestando várias características da fala em seus textos escritos.
Passa-se a partir deste momento, à descrição da pesquisa em textos concretos produzidos por uma turma de alunos do Ensino Médio em regime de aceleração de estudos.

3 Da coleta dos dados

3.1 Metodologia/Pesquisa-ação
Para analisar a interferência do oral nas redações escolares, partiu-se da perspectiva de que era importante verificar o comportamento dos alunos diante de tarefas escritas em textos do tipo dissertativo por necessitarem de mais formalidade em sua produção. Por isso, dentre as propostas de atividades desenvolvidas no primeiro semestre letivo de 2005 na referida turma, foi selecionada a seguinte: Proposta de produção de texto dissertativo, cujo tema “Liberdade: um valor absoluto ou uma questão de grau?” foi adaptado de SAVIOLI & FIORIN (1994:90-91), com texto base de, Bertrand Russel defendendo que a liberdade é uma questão de grau. (veja no anexo A como a proposta de redação foi levada aos alunos)

3.2 Caracterização da turma
Os alunos que produziram os textos analisados neste trabalho pertencem a uma turma de 2ª etapa da EJA da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Professor Bolívar Bordallo da Silva, localizada na cidade de Bragança, Pará. Esses alunos já ultrapassaram a faixa etária escolar para o ensino médio, porém, como na referida escola as turmas são organizadas por idade, eles estão na faixa etária entre 19 e 20 anos em sua maioria, sendo os mais novos nessa situação na escola em questão. Apenas 4 dos alunos desta classe possuem idade superior a 20 anos.
A classe era constituída inicialmente por 39 (trinta e nove) alunos matriculados, dentre os quais já houve a evasão de 4 (quatro) até o mês de junho. Dos 35 alunos que chegaram ao final do 1ª semestre e participaram das atividades de produção de textos, 14 são provenientes do ensino regular e 21 de cursos de aceleração. O gráfico abaixo mostra a origem escolar dos alunos e sua relação com a idade:





Dentre esses alunos alguns cursaram apenas a 4ª etapa, outros a 3ª e a 4ª etapas , ou seja, a metade do ensino fundamental foi feita em regime de aceleração de estudos. Esse fato foi levado em consideração já que contribui para diminuir o tempo de permanência do aluno na escola (instituição de educação formal), podendo ser significativo no resultado da análise.
A preferência de tarefas desta turma recai sobre a produção oral, da qual a maioria participa ativamente, desde que as atividades sejam baseadas na oralidade informal, pois, nas atividades orais mais formalizadas (como seminários e exposições orais de conteúdos) bem como na produção escrita, eles apresentam muitas dificuldades, que vão desde problemas de pronúncia e ortografia até a total falta de clareza e concatenação entre as idéias que pretendem apresentar. Por isso, esses alunos demonstram certa relutância em produzir trabalhos escritos. Isso dificultou bastante a coleta de textos para esta análise.

3.3 Apresentação do Corpus
O corpus que gerou as redações analisadas neste trabalho era composto inicialmente de 24 textos, já que nem todos os alunos da turma participaram desta atividade. Dentre estes textos, foram selecionados apenas 12 para serem analisadas neste artigo, sendo que o critério utilizado para essa seleção foi a maior ocorrência de características da fala observadas em um único texto escrito, de acordo com o item 2.2.1 deste trabalho e outros, observados posteriormente.
As demais redações foram descartadas porque os fenômenos observados nelas são recorrentes em toda a produção escrita coletada e mantê-las no corpus configuraria um exagero.

4 Análise dos dados e resultados obtidos
Depois de definidos os parâmetros de análise a partir das características da fala, passa-se a partir de agora a analisar os textos que compuseram o corpus deste trabalho. Para isso, serão destacados fragmentos das produções discentes “ipsis literis”, ou seja, o material analisado não sofrerá nenhum tipo de correção ortográfica ou de qualquer outra ordem a fim de garantir a fidedignidade do texto original. A organização da análise será apresentada da seguinte forma:
- Cada referência a um fragmento numerado corresponde a um trecho ou conjunto de trechos selecionados de um dos doze (12) textos escolhidos (organizados no anexo B). Os trechos que aparecem no texto de análise são partes desses fragmentos.
- As palavras ou expressões destacadas entre parênteses representam deduções de leitura devido a trechos ilegíveis ou incompreensíveis;
- A barra (/) indica que o resumo do trecho citado abrange a extensão do parágrafo;
- O ponto de interrogação entre parênteses - (?) - significa descontinuidade no trecho selecionado;
- Além do símbolo de descontinuidade, o sublinhado também marca o foco da análise;
- Um trecho pode ser utilizado mais de uma vez, pois de acordo com o grupo em que está sendo analisado será ressaltada uma característica diferente. Nesse caso, haverá a recorrência do número do fragmento podendo o mesmo apresentar-se resumido e com a devida mudança de foco.
A partir do corpus analisado foi possível elaborar um quadro de sete (7) tipos de marcas de oralidade que influenciaram na produção escrita dos alunos da 2ª etapa – EJA – do Ensino Médio, cinco (5) deles, previstos na fundamentação teórica (características do oral) e dois (2) que surgiram da observação do corpus. São eles:

4.1. Criação da linguagem popular:
a) Palavras e expressões populares:
Um exemplo desse tipo de criação da linguagem popular que é a expressão “muitas das vezes” (com uma variante: “muita das vezes”) que pode ser observada na fala de pessoas de diferentes níveis sociais na localidade em que foi coletado o corpus desta pesquisa. Essa expressão (em suas duas formas) foi encontrada nos trechos abaixo:

“(...) não devemos abusar da nossa liberdade. Por querer abusarmos da nossa liberdade muitas das vezes quebramos a cara. (...)” (fragmento 3)

“Mas somos combrados a todos os instantes da nossa vida, por inresponsabilidades que fazemos e muita das vezes, não asumimos e deichamos de ser cidadões de valores.” (fragmento 6)

Outros exemplos de palavras e expressão popular que deveriam ser evitadas em redações escolares desse tipo são os seguintes: “quebramos a cara” (fragmento 3)”; “chegar porre” (fragmento 4); “se agemte estiver presa”, “o que agemte gosta, que agemte pensa” (fragmento 2). Todas essas formas poderiam ser substituídas por outras mais apropriadas, tais como “encontramos problemas”, “chegar embriagada ou bêbada” ou mesmo ser eliminadas com as devidas conjugações verbais corrigidas, como no caso da expressão “a gente” (grafada “agemte” no texto): “se estivermos presos”, “o que gostamos”, o que pensamos”.
O termo destacado no trecho abaixo, também reflete muito o processo de criação popular através das regularidades da língua:

“(...) Então a liberdade é uma questão de grau onde o ser humano é sujeitado a respeitar (...)” (fragmento 12)

O verbo “sujeitar” (= dominar, subjugar), segundo o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa tem dois particípios passados, um regular (sujeitado) e outro irregular (sujeito), porém, no uso formal (que segue as normas gramaticais) o particípio regular deve ser empregado precedido do verbo “ter” ou “haver” e o particípio irregular do verbo “ser” ou “estar”. De acordo com essas regras, o emprego de “sujeitado” não está apropriado, mas na linguagem do dia-a-dia, o uso indistinto das duas formas é praticado com qualquer verbo que o preceda e isso acaba se refletindo nos textos escritos. Como o particípio irregular, neste caso, não é muito conhecido, a preferência pela forma regular se tornou cristalizada como expressão popular.

b) verbos em sentido amplo:
O verbo ter é um exemplo de palavra usada como coringa em várias situações que poderiam requerer verbos mais específicos. Na fala isso não é problema, mas na escrita a especificidade se faz necessária. Vejamos os exemplos, retirados do corpus:

“(...) Por isso temos que ter a regras de nossos país para nos orientar.” (fragmento 3)

“(...) ou seja tem que ter ética e andar de acordo com as leis estabelecida. (...)” (fragmento 12)

Estes enunciados trazem o verbo “ter” (no infinitivo) usado corretamente no sentido de possuir precedido do mesmo verbo conjugado usado com sentido ampliado. Uma possível substituição para este segundo caso é a de “temos que” e “tem que” por “ necessitamos” e “precisa”, respectivamente.

c) palavras em sentido generalizante:
São utilizadas em grande escala na linguagem falada devido à não lembrança de vocabulário específico no momento da enunciação. Geralmente estas palavras podem ter vários significados e já que na escrita formal os sentidos devem ser bem definidos, este artifício deveria ser evitado para não prejudicar a clareza do texto. Nas redações analisadas podemos encontrar como exemplos:

“Liberdade, um nome forte mais para muitas pessoas que querem a liberdade não e dificil conseguir”(fragmento 1)

“A liberdade não é uma coisa pequena, sim pro resto da vida (...)”. (fragmento 2)
“A liberdade é um valor que todos nós possuímos (...)
Por isso, que no meu ponto de vista, a liberdade não pode ser absoluta, mas deve ter sempre algumas coizas que nos ajudem a crescer na liberdade (...)” (fragmento 7)

“Que são esses valores, que nós levam a algum lugar para podermos ser cidadões de bem com a liberdade do mundo.” (fragmento 6)

Em nenhum dos termos destacados nos fragmentos acima o sentido está bem definido, todos os vocábulos dão uma vaga impressão da idéia que deveria ser expressa.

4.2. Espontaneidade da fala:
É o discurso desvinculado de valores gramaticais rígidos, tais como: conectores específicos, concordância, conjugação verbal correta e organização da sintaxe. A falta desses itens pode ser encontrada nos casos a seguir:
a) Falta de conectores específicos:
Um dos casos em que se verifica a falta de conectivos específicos na oralidade é, na maioria das vezes, quando se usa o advérbio “onde” desprovido de seu valor locativo. Muitas vezes isso se repete na escrita, como no exemplo abaixo:

“(...) Então a liberdade é uma questão de grau onde o ser humano é sujeitado a respeitar (...)É por isso que a liberdade não um valor absoluto e sim uma questão de grau. onde o ser humano da moral para receber dignidade e também respeito.” (fragmento 12)

Às vezes, quando há a necessidade do advérbio ou expressão com valor específico, como “onde”, “quando” ou “quem”, estes não aparecem. O que dá lugar a eles no enunciado é um “que” (muito usado como pronome curinga). Esse também é um vício na fala que se reflete na escrita. Veja os exemplos:

“Existem lugares que os povos não tem previleigio de escolher governantes para adimistrar. o seu paíz (...).” (fragmento 5)

“(...) nossa liberdade em relação ao ambiente escolar é na Hora do intervalo que podemos conversa avontade com os nossos colegas (...).” (fragmento 10)

No primeiro caso, o que poderia ser substituído perfeitamente por “onde” ou “nos quais” e no segundo caso a substituição poderia ser por “quando”.

b) falta de concordância:
Muitos erros de concordância em textos escritos decorrem do descuido da linguagem oral em sua realização cotidiana. São exemplos desse descuido a não concordândia entre o artigo e o substantivo ou entre o substantivo e o adjetivo, na linguagem coloquial falada, como os observados nos trechos abaixo:

“(...) hoje no nosso paiz. os direito são iguais tanto para o homem como a mulher.” (Fragmento 5)

“(...) o ser humano é sujeitado a respeitar ou seja tem que ter ética e andar de acordo com as leis estabelecida.” (fragmento 12)

c) desvios na conjugação verbal:
Outro fator que não é muito observado na linguagem oral é a conjugação verbal correta. Isso se manifesta também na escrita pela freqüência com que ocorre, como podemos observar nos trechos a seguir:

“A nossa liberdade podemos ter um dia se nos esforçarmos e tenta apreender algo a cada dia e ser sempre felizes (...).” (Fragmento 8)

“(...) Quando falamos em liberdade podemos falar sobre as decizões que podemos tomarmos.” (fragmento 5)

Os dois exemplos diferem porque enquanto no primeiro o problema está no tempo verbal (o uso do presente “podemos” pelo futuro “poderemos”), no segundo o problema incide sobre um dos verbos da locução que deveria ficar no infinitivo e apareceu conjugada (“tomarmos”). Estes são apenas exemplos de duas das inúmeras dificuldades que os falantes têm em relação ao uso dos verbos.

d) falta de rigidez na sintaxe:
Muitas vezes, em períodos longos, há de se dar preferência à ordem direta da oração para não ter que fazer repetições desnecessárias e tornar o texto denso demais e também confuso. Um caso muito comum de problema com a sintaxe na língua escrita, decorrente da influência da fala é a desorganização das idéias em uma disposição linear. Os longos trechos sublinhados delimitam as partes que poderiam ser reordenadas para tornar o texto mais fluente, é claro que eliminando algumas repetições e palavras desnecessárias e também encadeando melhor as partes removidas de seu lugar de origem.

“ Para viver em uma sociedade e preciso ter conhecimento, educação etc.... E a partir daí que vamos conquistar uma liberdade dentro de uma sociedade pois a maioria das coisas que se fazem errado ele cobra ou faz um julgamento do que você fez.” (fragmento 1)

“(...) ela achava que liberdade era fazer tudo o que ela queria, sair pra festa, chegar porre em casa, há ela achava lindo e ainda dizia que ela tinha total liberdade (...)” (fragmento 4)

“A nossa liberdade podemos ter um dia se nos esforçarmos e tenta apreender algo a cada dia e ser sempre felizes.(...)” (Fragmento 8)

4.3. Descontinuidade:
A descontinuidade pode se apresentar sob diversas formas. As que apresentaremos aqui são as que podem ser exemplificadas através do corpus selecionado.
a. frase inacabada:
A frase inacabada é um problema também de sintaxe, mas com a agravante de ser de caráter defectivo, ou seja, há o prejuízo de uma idéia ou de um elo que une uma idéia à outra (mais grave do que uma simples troca de conectivo). É o que se pode observar nos exemplos a seguir:

“Liberdade, um nome forte (?) mais para muitas pessoas que querem a liberdade não e dificil conseguir” (fragmento 1)

“A liberdade não é uma coisa pequena, (?) sim pro resto da vida, se agente estiver presa em algum problema aprenda a resolver (...)
.........................................................................................................................................
Liberdade pra quem: A resposta pode ser encomtrada. nos quatro cantos do mundo. No Brasil, encomtra-se nos famitos, nos endigentes, nas crianças abandonadas, nas mulheres descriminadas, nos indios, na exclusão social dos negros, enfin em todas as pessoas que foram colocadas as margens da sociedade, (?) mais devemos ter sim a nossa liberdade (...)” (fragmento 2)

“Nós não vivemos no mundo livre pois, devemos cumprir regras em todos os momentos (?) é assim vamos, vivendo cada dia achando, que somos pessoas de bem com o mundo.” (fragmento 6)

“O ser humano pensa que a liberdade é usada em todo momento pelo fato da expressão (?).
Não é exatamente assim (...)” (fragmento 9)

Nos quatro primeiros casos de descontinuidade por frase inacabada (extraídos dos fragmentos 1, 2 e 6), podemos observar uma aparente tentativa de manter o elo. Aparente porque é apenas formal porque no nível de sentido, logo após o símbolo que marca o ponto da descontinuidade a frase tomou outro direcionamento deixando a seqüência anterior incompleta. No quinto caso (fragmento 9) a interrupção da seqüência se deu de forma abrupta, já que a palavra “expressão” no final da oração não foi capaz de explicar a intenção do produtor do texto.

b. repetições:
São, segundo Koch (2001:100) “fenômenos extremamente freqüentes no texto falado, nele tendo diversas funções”, mas que o texto escrito deveria minimizar. As repetições podem ser: constantes de um mesmo vocábulo ou repetição de mesma idéia (paráfrase), que se mantida no texto junto com a anterior, provoca uma redundância. São exemplos de repetições extraídos do corpus:

“ Para viver em uma sociedade e preciso ter conhecimento, educação etc.... E a partir daí que vamos conquistar uma liberdade dentro de uma sociedade pois a maioria das coisas que se fazem errado ele cobra ou faz um julgamento do que você fez.” (fragmento 1)

Essa repetição, como foi visto, no item 4.2 ao tratar-se dos casos de falta de rigidez na sintaxe, pode ser eliminada com uma reordenação do enunciado. Já o exemplo seguinte é diferente:

“Um exemplo é uma moça (...), ela achava que liberdade era fazer tudo o que ela queria, sair pra festa, chegar porre em casa, há ela achava lindo e ainda dizia que ela tinha total liberdade, Hoje no fundo do poço, ela pensa de outra forma, que se ela, tivesse, parado pra pensar no que ela estava fazendo, e que liberdade não era apenas fazer tudo aquilo que ela queria, talvez hoje ela estivesse bem melhor.” (fragmento 4)

Ele apresenta muitas repetições de mesmo vocábulo (o pronome “ela”) e poderia ser melhor escrito com algumas substituições, retomadas do termo “moça” ou equivalente (como “senhorita”, “garota” etc.) e também com alguns apagamentos (elipse do sujeito).
Ao escrever, é preciso se ter consciência dos instrumentos de que se dispõe, e fazer uso deles, para se obter uma boa produção e os elementos de retomada e antecipação são muito úteis nesse processo porque são também muito amplos.
Um outro exemplo de repetição encontrado no material de análise foi o pronome-cópia, que repete uma informação já expressa por outro termo de mesmo valor sintático e semântico:

“(...) a liberdade ela é uma das maiores alegrias que o serumano pode ter, por isso saiba desfruta a sua livre do perigo que o mundo nos tráz.” (fragmento 10)

“O país (var) contese mais cois mundo pois, (você) ver na televição a criança ela. Entendi mais conpreende a (pessoa).” (fragmento 11)

Em ambos os casos, o pronome “ela” refere-se a uma informação já expressa pelo sujeito da oração (“a liberdade” e “a criança”). Essa cópia de informação é redundante e deve ser excluída da produção escrita.

4.4. Reformulações:
São necessárias tanto no texto oral quanto no texto escrito, mas neste último tem a finalidade de apagar o que ficou mal formulado. Não deve restar vestígios do que necessitou de reformulação. Quando não há o apagamento da idéia anterior, o texto fica com características de linguagem oral, como no exemplo a seguir:

“(...)Então a liberdade é uma questão de grau onde o ser humano é sujeitado a respeitar ou seja tem que ter ética e andar de acordo com as leis estabelecida.” (fragmento 12)

Na tentativa de reformular para deixar mais clara a idéia anterior (que ainda não estava concluída), o trecho explicativo inserido tornou o enunciado mais confuso. Essa era uma reformulação desnecessária e para conferir status de linguagem escrita formal ao enunciado basta eliminar o falso trecho reformulativo.
Freqüentes reformulações deixam o texto denso. Na fala, o que foi dito já passou, por isso é permitido dizer de novo de uma outra forma a fim de explicar melhor. Mas na escrita, este recurso deve ser usado com prudência.

4.5. Redução de palavras:
É um fenômeno muito comum na linguagem oral e com frqüência também encontramos na linguagem escrita, como nestes casos:

“A liberdade não é uma coisa pequena, sim pro resto da vida, (...)
..........................................................................................................................
Liberdade pra quem: (...) mais devemos ter sim a nossa liberdade, pra fazermos o que agemte gosta, que agemte pensa, (...).” (fragmento 2)

“(...) que se ela, tivesse, parado pra pensar no que ela estava fazendo (...)” (fragmento 4)

Essas reduções de “para” e “para o” à “pra” e “pro” são bastante comuns, tanto quanto as reduções pela supressão do /r/ dos infinitivos verbais exemplificados a seguir:

“(...) sempre tem alguém para cobra de ti ou e a família ou a sociedade.” (fragmento 1)

“(...) nossa liberdade em relação ao ambiente escolar é na Hora do intervalo que podemos conversa avontade com os nossos colegas e as regras são respeita os professores na sua aula (...).
(...) devidos as leis que o nosso país tem, a liberdade ela é uma das maiores alegrias que o serumano pode ter, por isso saiba desfruta a sua livre do perigo que o mundo nos tráz.” (fragmento 10)

“A nossa liberdade podemos ter um dia se nos esforçarmos e tenta apreender algo a cada dia e ser sempre felizes.(...)” (Fragmento 8)

4.6. Outros casos:
4.6.1. motivação fonética:
Um outro fato descoberto no corpus analisado e que não se encaixa em nenhum item abordado na fundamentação teórica deste trabalho foi a motivação fonética que apresentou de três (3) modos diferentes, de acordo com cada bloco de exemplos demonstrado abaixo:
a) não correspondência entre vocábulo formal e vocábulo fonológico, o que faz com que muitas vezes, na escrita, encontre-se construções do tipo:

“E apartir dai que vamos conquistar uma liberdade dentro de uma sociedade (...)” (fragmento 1)

“(...) ela é uma das maiores alegrias que o serumano pode ter (...)” (fragmento 10)

b) não correspondência entre fonema e letra também provoca transtornos à escrita, já que não se escreve como se fala. Nesse sentido, também pode-se considerar que são casos de marcas de oralidade por motivação fonética a confusão entre os vocábulos escritos “mais” e “mas” por apresentarem a mesma pronúncia no uso cotidiano. Isso causa dificuldades no momento da produção escrita porque o aluno, que não domina o emprego diferente dessas palavras, tende a escrever como pronuncia, o que provoca trocas como as apresentadas nos fragmentos abaixo:

“Liberdade, um nome forte mais para muitas pessoas que querem a liberdade não e difícil conseguir” (fragmento 1)

“(...) se agente estiver presa em algum problema aprenda a resolver do começo para não chegar mas lomge, porque será mas difícil resolver.”
.......................................................................................................................................
(...) enfin em todas as pessoas que foram colocadas as margens da sociedade, mais devemos ter sim a nossa liberdade (...)” (fragmento 2)

Todas as ocorrências de “mais” e “mas” destacadas nos fragmentos selecionados estão empregados de modo equivocado. Um outro exemplo que também merece ser considerado como decorrente da influência da oralidade nas redações escolares, ocasionada pela não correspondência entre fonema e letra, devido à falta de intimidade dos estudantes com a linguagem verbal escrita é o que segue nos trechos abaixo:

“A liberdade é um valor que todos nós possuímos, mas que nem sempre, é compriendida por nós, isso por que as vezes, compriendemos de maneira erada, ou seja, confundimos liberdade com libertinagem, que em veis de nos ajudar, acaba nos prejudicando.
Por isso, que no meu ponto de vista, a liberdade não pode ser absoluta, mas deve ter sempre algumas coizas que nos ajudem a crescer na liberdade, e a compriender o verdadeiro sentido de liberdade, que não é fazer o que eu quero, mas viver com equilíbrio na sociedade.” (fragmento 7)

“Existem lugares que os povos não tem previleigio de escolher governantes para adimistrar. o seu paíz (...) (fragmento 5)

c. hiper-correção da linguagem:
Outro fator ainda dentro de motivação fonética é a hiper-correção que se traduz principalmente por vocábulos ditongados, quando o ditongo é inexistente, como nos casos a seguir:

“A violença e a traveis da liberdade por que é muito (...).” (fragmento 11)

“Existem lugares que os povos não tem previleigio de escolher governantes (...)” (fragmento5)

Além da ditongação, que é bastante comum na fala, outros tipos de hiper-correção também podem ocorrer, como este exemplo extraído do corpus:

“Mas somos combrados a todos os instantes da nossa vida, por inresponsabilidades que fazemos e muita das vezes, não asumimos e deichamos de ser cidadões de valores.” (fragmento 6)

Esse caso pode ser explicado pela analogia com palavras como “infelicidade”, “incapacidade” etc, que necessitam do prefixo “in-“ para a sua formação e não do alofone “i-“ como seria o caso de “irresponsabilidade”, “irritabilidade” entre outras.

4.6.2. mistura de locutores sem sinalização:
Este outro exemplo é independe de motivação fonética. Caso semelhante foi verificado na análise de narrações feitas por Bastos (2001:95) e denominado de “alternância comentário/narração”. Em narrativas orais, esse fenômeno ocorre a todo instante e pode ser utilizado também em textos narrativos escritos (resguardando-se suas características próprias) de variadas formas. Porém, em textos dissertativos, quando não há uma seqüência narrativa inserida, esse artifício deve ser dispensado. Pode-se observar seus efeitos no fragmento da redação escolar analisada:

“Para poder dizer tenho liberdade tem que ter atitude.” (fragmento 9)

5. Conclusão

Na maioria dos textos analisados, ficaram evidentes vários dos problemas de textualidade apresentados pelos alunos do ensino médio EJA. Esses problemas vão desde aspectos primários da organização até profundas confusões entre idéias divergentes, porém, a preocupação maior deste artigo foi verificar se havia interferências da oralidade informal dos estudantes em sua produção textual escrita que deveria estar pautada em uma linguagem formal.
Foi com este intuito e com a certeza de que uma das principais funções da escola é tornar o aluno apto a novas possibilidades de expressão, incluindo aí a escrita, que se levantou a hipótese de que para se chegar lá era necessário percorrer um longo caminho através do exercício constante da oralidade e da leitura dentro da sala de aula.
É uma lástima constatar, porém, que essas atividades ainda não são realidade freqüente nas aulas de Português desde o ensino fundamental, pois, de acordo com Rocha (In: MOARA, 1998:154): “As atividades, em sala de aula, direcionadas ao trabalho com a escrita alternam-se ora em atividades de interpretação, ora em atividades de produção de textos, porém essas atividades são realizadas de forma isolada e superficial, o que não proporciona resultados satisfatórios.”
Por esse motivo, é comum as produções dos alunos se apresentarem sempre da mesma forma e com a mesma linguagem em textos de vários gêneros e também completamente distanciados das características de textos em sua modalidade escrita. Essa prática de escrita acompanha o indivíduo desde o ensino fundamental e, no ensino médio, quando ele vai precisar fazer uso constante de uma escrita mais formalizada, encontra muitas barreiras internas que são difíceis de quebrar, porque a escrita ocupou por muito tempo um lugar de supremacia sobre a oralidade na escola, no intuito de substituir as características “erradas” da fala coloquial. Porém hoje não se pode deixar de falar de gêneros textuais sem prescindir da linguagem oral como prática social e cultural distinta, mas complementar da realização em linguagem escrita.
Se a oralidade coloquial vem interferindo nas produções escritas formais, uma solução óbvia é tornar o aluno competente na produção de textos orais mais formalizados, pois ele necessita de uma gramática mais complexa no uso diário da língua para que possa se converter em benefícios para toda e qualquer manifestação comunicativa, seja ela oral ou escrita. Nesse caso, o professor tem um papel muito importante: ele deve ser o introdutor da atualização do conceito de gêneros do discurso e as novas tendências metodológicas sobre o ensino de língua portuguesa em sala de aula. Isso só tem a contribuir para uma nova conscientização sobre a questão da produção textual na escola.
Na atualidade, os cursos de formação de professor dão grande ênfase ao pedagogismo ou ao conteudismo exacerbado sem considerar a relevância da aplicação de uma metodologia e sua relação com os conteúdos que deverá ensinar. É necessário, portanto, que o docente seja criativo e adapte o objeto de ensino aos contextos situacionais do cotidiano da escola e com a realidade circundante, pois só com o conhecimento da realidade é que se pode retirar da educação formal proveito para as diferentes situações com que professor e aluno se deparam. Favorecendo uma cultura geral ampla é possível alcançar o desenvolvimento da sensibilidade e da imaginação, melhorando a possibilidade de produzir significados e interpretações do que se vive para ligar ao conteúdo estudado e potencializar a qualidade da educação formal.
Se oito anos regulares de estudo não estão sendo suficientes para que o aluno brasileiro ingresse no ensino médio com certa proficiência na produção textual, o problema é agravado nas turmas de EJA com a diminuição deste tempo de permanência em sala de aula pela metade do tempo. Esse fato associado a um ensino de língua materna pautado não no texto, mas na metalinguagem, coloca barreiras ao ensino das 4 habilidades lingüísticas previsto nos programas oficiais (ouvir, falar, ler e escrever) porque se restringe às modalidades orais e escritas informais, o que não caracteriza uma evolução na aprendizagem além do processo de alfabetização, já que a fala informal é adquirida fora dos meios escolares e depois que o indivíduo escolarizado adquire a técnica da escrita ele deve aperfeiçoá-la para poder progredir cognitivamente. Pois para ser um indivíduo letrado, não basta apenas ser alfabetizado (no sentido de ser capaz de codificar e decodificar a linguagem escrita apenas).
Se esse aluno do ensino médio tem dificuldades óbvias em passar do nível da linguagem oral informal ao da escrita formal, se faz necessário delimitar esses níveis estabelecendo a distinção clara entre um e outro para que as duas modalidades sejam manipuladas em sala de aula de forma que o aprendente possa verificar inadequações em sua produção e seja capaz de transformá-la de acordo com cada propósito comunicativo. Por mais que o professor e os materiais didáticos contribuam para que a aprendizagem se realize, é o próprio aluno que tem a tarefa de construir significados sobre os conteúdos que aprende, modificando-os e enriquecendo-os para construir novos e mais fortes instrumentos de ação. Então ele precisa despertar para a realidade de que norma culta não se relaciona apenas com texto escrito e que texto oral não se materializa apenas através da linguagem coloquial e assim, motivar o aluno a não escrever sempre do mesmo modo como fala.
Todo este trabalho baseou-se na perspectiva de que as análises das interferências da oralidade em textos escritos viessem de alguma forma ajudar o professor a perceber melhor quais as limitações do aluno no que diz respeito à produção textual e posteriormente transformar essa percepção em auxílio para sua prática pedagógica no ensino-aprendizagem de língua materna.
Convém ainda ressaltar que, neste trabalho, não foram observadas todas as características de fala citadas teoricamente, pos limitou-se a tratar apenas das marcas de oralidade encontradas nas redações que compuseram o corpus selecionado. Em função disso, muitos outros fenômenos de interferência do oral em produções escritas podem ser descobertas para se tornarem instrumentos de retextualização pelo próprio aluno.
Apesar dos limites que envolveram a produção deste trabalho e pelo modo simples com que foi apresentada a análise das redações escolares do ensino médio, esperamos que este estudo desperte reflexões sobre o ensino da língua materna, bem como o alargamento de horizontes quanto aos gêneros do discurso (assunto muito discutido na hoje em dia, mas também muito controverso) além de deixar para os educadores a certeza de que é necessário instrumentalizar nossos educandos a partir da expressão oral para que possam vir a dominar com certa facilidade os mecanismos lingüísticos de que dispõem para produzir um bom texto, sempre levando em consideração a função de sua produção enquanto ato de comunicação.

ANEXOS:
Anexo A: Atividade desenvolvida em 06/05/2005
Texto base:
No ensino, como em outras coisas, a liberdade deve ser questão de grau. Há liberdades que não podem ser toleradas. Uma vez conheci uma senhora que afirmava não se dever proibir coisa alguma a uma criança, pois deve desenvolver sua natureza de dentro para fora. “E se sua natureza a levar a engolir alfinetes?” Indaguei; lamento dizer que a resposta foi puro vitupério. No entanto, toda criança abandonada a si mesma, mais cedo ou mais tarde engolirá alfinetes, tomará veneno, cairá de uma janela alta ou doutra forma chegará a mau fim. Um pouquinho mais velhos, os meninos, podendo, não se lavam, comem demais, fumam até enjoar, apanham resfriados por molhar os pés, e assim por diante — além do fato de se divertirem importunando anciãos, que nem sempre possuem a capacidade de resposta de Eliseu . Quem advoga a liberdade da educação não quer dizer que as crianças devam fazer, o dia todo, o que lhes der na veneta. Deve existir um elemento de disciplina e autoridade; a questão é até que ponto, e como deve ser exercido.
RUSSEL, Bertrand. Ensaios céticos. 2.ed. São Paulo, Nacional, 1957. p. 146.
NOTA: Eliseu é um profeta bíblico, discípulo de Elias. Um dia, um grupo de rapazes zombava dele. O profeta então amaldiçoou-os em nome do Senhor. Imediatamente saíram da floresta dois ursos, que despedaçaram quarenta e dois daqueles rapazes. O episódio é relatado em II Reis, 2,23-25. (...).

Atividades de compreensão oral do texto:
Nesta etapa da atividade foi desenvolvida uma discussão oral sobre as impressões gerais da leitura, na qual os alunos acrescentaram exemplos e ampliaram o tema de “liberdade no ensino” para a “liberdade em geral”, sempre através da mediação da professora, que tinha por objetivo motivar as idéias para a produção textual escrita.

Comando da proposta de produção escrita:
O texto de Bertrand Russel mostra que a liberdade no ensino é uma questão de grau e não significa fazer o que bem se entende. O autor mostra que há situações em que se devem estabelecer proibições às crianças para que mais tarde não venham a fazer coisas erradas.
Para os adultos, a liberdade é um valor absoluto ou também é uma questão de grau? Redija um texto dissertativo expondo seu ponto de vista. Se você considerar que a liberdade não tem restrições, explique bem o porquê; se você acha que a liberdade é uma questão de grau, deixe bem claros os limites desse direito.

ANEXO B: Fragmentos analisados dos textos
Fragmento 1: (texto 1- linhas 8-18)
“ Para viver em uma sociedade e preciso ter conhecimento, educação etc.... E a partir daí que vamos conquistar uma liberdade dentro de uma sociedade pois a maioria das coisas que se fazem errado ele cobra ou faz um julgamento do que você fez.
Hoje, para ser livre e preciso primeiro conquistar essa liberdade e ao conseguir não abusar dela pois sempre tem alguém para cobra de ti ou e a familia ou a sociedade.
Liberdade, um nome forte mais para muitas pessoas que querem a liberdade não e dificil conseguir”

Fragmento 2 (texto 2 – linhas 3-5 e 12-20)
“A liberdade não é uma coisa pequena, sim pro resto da vida, se agemte estiver presa em algum problema aprenda a resolver do começo para não chegar mas lomge, porque será mas difícil resolver.
...............................................................................................................................
Liberdade pra quem: A resposta pode ser encomtrada. nos quatro cantos do mundo. No Brasil, encomtra-se nos famitos, nos endigentes, nas crianças abandonadas, nas mulheres descriminadas, nos indios, na exclusão social dos negros, enfin em todas as pessoas que foram colocadas as margens da sociedade, mais devemos ter sim a nossa liberdade, pra fazermos o que agemte gosta, que agemte pensa, e resolver nossos problemas, mas é importante lembrar que essa liberdade também tem seu limite.”

Fragmento 3 (texto 3 – linhas 5-9)
“(...) não devemos abusar da nossa liberdade. Por querer abusarmos da nossa liberdade muitas das vezes quebramos a cara. Por isso temos que ter a regras de nossos país para nos orientar.”

Fragmento 4 (texto 4 – linhas 1-16)
“Eu acho que liberdade tem que ir até um certo ponto, pôs liberdade total às vezes destrói, a vida de pessoas que acham que a vida é só curtição.
Pôs em certo ponto liberdade total prejudica muito, seja quem for.
Um exemplo é uma moça (...), ela achava que liberdade era fazer tudo o que ela queria, sair pra festa, chegar porre em casa, há ela achava lindo e ainda dizia que ela tinha total liberdade, Hoje no fundo do poço, ela pensa de outra forma, que se ela, tivesse, parado pra pensar no que ela estava fazendo, e que liberdade não era apenas fazer tudo aquilo que ela queria, talvez hoje ela estivesse bem melhor.”
Fragmento 5 (texto 5 – linhas 6-13)
“(...) Quando falamos em liberdade podemos falar sobre as decizões que podemos tomarmos.
Existem lugares que os povos não tem previleigio de escolher governantes para adimistrar. o seu paíz mulheres que não podem sair sem um pano na cabeça cobrido o resto hoje no nosso paiz. os direito são iguais tanto para o homem como a mulher.”

Fragmento 6 (texto 6 – linhas 1-13)
“Nós não vivemos no mundo livre pois, devemos cumprir regras em todos os momentos é assim vamos, vivendo cada dia achando, que somos pessoas de bem com o mundo.
Mas somos combrados a todos os instantes da nossa vida, por inresponsabilidades que fazemos e muita das vezes, não asumimos e deichamos de ser cidadões de valores.
Que são esses valores, que nós levam a algum lugar para podermos ser cidadões de bem com a liberdade do mundo.”

Fragmento 7 (texto 7 – linhas 1 - 13)
“A liberdade é um valor que todos nós possuímos, mas que nem sempre, é compriendida por nós, isso por que as vezes, compriendemos de maneira erada, ou seja, confundimos liberdade com libertinagem, que em veis de nos ajudar, acaba nos prejudicando.
Por isso, que no meu ponto de vista, a liberdade não pode ser absoluta, mas deve ter sempre algumas coizas que nos ajudem a crescer na liberdade, e a compriender o verdadeiro sentido de liberdade, que não é fazer o que eu quero, mas viver com equilíbrio na sociedade.”

Fragmento 8 (texto 8 – linhas 13-16)
“A nossa liberdade podemos ter um dia se nos esforçarmos e tenta apreender algo a cada dia e ser sempre felizes. Pois liberdade não se compra, se adquere.”

Fragmento 9 (texto 9 – linhas 1- 4 e 11-12)
“O ser humano pensa que a liberdade é usada em todo momento pelo fato da expressão.
Não é exatamente assim (...)
...................................................................................................................................
Para poder dizer tenho liberdade tem que ter atitude.”

Fragmento 10 (texto 10 – linhas 3-8 e 13-18)
“(...) nossa liberdade em relação ao ambiente escolar é na Hora do intervalo que podemos conversa avontade com os nossos colegas e as regras são respeita os professores na sua aula (...).
(...) devidos as leis que o nosso país tem, a liberdade ela é uma das maiores alegrias que o serumano pode ter, por isso saiba desfruta a sua livre do perigo que o mundo nos tráz.”

Fragmento 11(texto 11 – linhas 1-2 e 7-10)
“A violença e a traveis da liberdade por que é muito (...).
.......................................................................................................................
O país (var) contese mais cois mundo pois, (você) ver na televição a criança ela. Entendi mais conpreende a (pessoa).”

Fragmento 12 (texto 12 – linhas 3-5 e 12-20)
“(...) Então a liberdade é uma questão de grau onde o ser humano é sujeitado a respeitar ou seja tem que ter ética e andar de acordo com as leis estabelecida. É por isso que a liberdade não um valor absoluto e sim uma questão de grau. onde o ser humano da moral para receber dignidade e também respeito.”

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NOTAS:
* EJA – Educação de Jovens e Adultos. Para este trabalho foram escolhidas como objeto de análise as produções de alunos de apenas uma turma de alunos da 2ª etapa, Ensino Médio.
1. Outros tipos de textos já previstos no programa de língua estrangeira do PSS: expositivos, explicativos, conversacionais, procedurais e instrucionais. No programa de Língua Portuguesa mantém-se a trilogia narração, descrição e dissertação e incluiu-se a argumentação.
2. Grifo do autor.
3. Esta obra foi publicada originalmente em russo com o título Estétika Sloviésnova Tvórtchestva, em Moscou, 1979. Esta é a 4ª edição traduzida a partir do russo. A primeira edição traduzida data de 1992.
4. O termo “séries”, mais adaptado à nossa realidade escolar majoritária, foi acrescentado pelas tradutoras.[N.T.]
5. Neste trabalho, deixaremos de lado de lado os recursos de ordem pictórica por não serem relevantes para as análises.
6. Os tópicos relacionados a seguir são frutos de pesquisas em materiais diversos, tais como os de ALVES (1993); CÂMARA JR. (1974), BASÍLIO (1991) KOCH (2001), entre outros, e adaptados conforme a necessidade deste trabalho.
7. Nos casos em que emissor e receptor relacionam-se diretamente implica um feed-back imediato. É o que caracteriza a conversação segundo Marcuschi (2003a:15).
8. Na escrita, a ausência de referentes concretos obriga o produtor do texto a explicitar tudo através da linguagem verbal.
9. Segundo Fávero et. Al. (2000:44): “A expressão marcador conversacional serve para designar não só elementos verbais, mas também prosódicos e não lingüísticos que desempenham uma função interacional qualquer na fala (...)”. Porém os que interessarão nas análises deste trabalho são os marcadores verbais.
10. Marcuschi (apud Koch, 2001:69).
11. Excetua-se, neste caso, as situações de comunicação oral pela televisão e pelo rádio, nas quais muitas vezes a transmissão é oral mas o texto é planejado previamente e tem características de texto escrito, salvo nas relações interativas já existentes na atualidade.
12. Excetuando-se os casos de desvios gramaticais intencionais, de acordo com propósitos comunicativos específicos, como por exemplo a caracterização de determinadas variantes lingüísticas consideradas não-padrão.
13. Palavras como “coisa”, “botar”, “fazer”, entre outras, devem ser evitadas na escrita, a não ser que haja forte motivo para a presença delas.
14. A correspondência entre etapas e séries é: 3ª etapa (5ª e 6ª séries) e 4ª etapa (7ª e 8ª séries).



REFERÊNCIAS:

ALVES, Sonia Célia de Oliveira. Por um Ensino/Aprendizagem da Expressão Oral em Contexto Escolar. Dissertação de Mestrado, Belém-Pará: UFPA, 1993.
ANGELIM, Regina Célia C. & SILVA, Edila Vianna da. Variação, gênero textual e ensino. In: PAULIUKONIS, Maria Aparecida Lino & GAVAZZI, Sigrid (org.). Da língua ao discurso: reflexões para o ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005, pp. 161-172.
AURÉLIO BUARQUE DE HOLANDA. Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa. 1ª edição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988.
BAKHTIN, Mikhail. Os Gêneros do discurso. In: _____ . Estética da Criação Verbal (Paulo Bezerra: introdução e tradução do russo), 4ª ed. – São Paulo: Martins Fontes, 2003, pp. 261-306.
BASÍLIO, Margarida. Teoria Lexical, 3ª ed. São Paulo: Ática, 1991.
BASTOS, Lúcia Kopschitz. Coesão e Coerência em Narrativas escolares. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
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CÂMARA JR., Joaquim Mattoso. Manual de Expressão Oral e Escrita. Rio de Janeiro: J.Ozon, 1974.
DOLZ, Joaquim; NOVERRAZ, Michele & SCHNEUWLY, Bernard. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In. SCHNEUWLY, Bernard &DOLZ, Joaquim et al. Gêneros Orais e Escritos na Escola (tradução e organização Roxane Rojo). São Paulo, Campinas: Mercado de Letras, 2004, Cap. 4, pp. 95-127.
_____ ; PIETRO, Jean-François de & SCHNEUWLY, Bernard. Relato da elaboração de uma seqüência: o debate público. In. SCHNEUWLY Bernard &DOLZ, Joaquim et al. Gêneros Orais e Escritos na Escola (tradução e organização Roxane Rojo). São Paulo, Campinas: Mercado de Letras, 2004, Cap. 9, pp. 247-278.
KLEIMAN, Ângela B. Oralidade letrada e competência comunicativa: implicações para a construção da escrita em sala de aula. In: SCRIPTA vol 5, nº 10, jul/dez 2002.
KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. A inter-ação pela linguagem. São Paulo: Contexto, 2001.
_____ . Os gêneros do discurso. In: _____ . Introdução à Lingüística Textual. São Paulo: Martins Fontes, 2004. (Cap. 10 - pp. 159-168)
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PÉCORA, Alcir. Problemas de redação. 2ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 1986.
ROCHA, Fátima Cristina Pessoa. A Progressão textual em redações de alunos da 5ª série do ensino fundamental. In: MOARA: Revista dos Cursos de Pós-graduação em Letras UFPA. Belém, nº 9, pp. 153-161, jan/jun, 1998.
SANTOS, Leonor Werneck dos. O ensino de Língua portuguesa e os PCN. In: PAULIUKONIS, Maria Aparecida Lino & GAVAZZI, Sigrid (org.). Da língua ao discurso: reflexões para o ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. (pp.173-184)
SAVIOLI, Francisco Platão & FIORIN, José Luiz. Para entender o texto: leitura e redação. São Paulo: Ática, 1994.